DESBRAVANDO A CHAPADA DIAMANTINA
- Mara Machado
- 20 de ago. de 2017
- 6 min de leitura
Percorrer mais de 3 mil km de carro, não é para qualquer um, mas como tudo na vida, sempre há uma primeira vez. Saímos do Sul para a Bahia. Eu particularmente já havia feito uma viagem tão longa quanto, até o Chile, porém sem o desgaste ocasionado pela escalada. Mas desta vez a vibe foi totalmente diferente, pois a ideia do grupo era escalar. Foram três dias de viagem na ida e outros três na volta, decidimos fazer paradas ao final de cada dia, mas tivemos que enfrentar alguns contratempos, como engarrafamentos, e algumas paradas obrigatórias para alimentação e o rico cafezinho para dar um up! Tínhamos um total de 15 dias para gastar os dedos na rocha, sonhando com aquela escalada ao lado de uma linda cascata.

Para nossa sorte, apesar de termos chegado na Chapada Diamantina naquele rico período de chuvas torrenciais (fevereiro/2017), enquanto estivemos lá, só sentimos a chuva no primeiro dia, na cidade de Ibicoara-BA, quando passamos a noite em uma barraca. A chuva alterou os ânimos, pois o plano era escalar na região... Então... em um flash de pensamento, todos optaram por seguir rumo ao Morro do Pai Inácio e contornar toda a Chapada, assim poderíamos ter uma chance de conhecer outros lugares e fazer ao menos um turismo, caso não fosse possível escalar.

Nós estávamos preparados para qualquer emoção! Adquirimos um guia turístico da região e fomos seguindo em direção a alguns pontos selecionados previamente. Para a nossa felicidade não houve mais chuvas em todo o período em que estivemos lá, tristeza para os locais que viam seus atrativos turísticos escorrem entre os dedos, muita seca, rios e cachoeiras sem água. A economia da Chapada Diamantina girava em torno do garimpo. Inicialmente o principal tesouro extraído era o diamante, depois foi o carbonato, este era conhecido como o diamante negro. Com a proibição do garimpo, que estava destruindo as paisagens naturais, a grande aposta foi feita no turismo. Muitas pessoas foram embora da região, e os poucos que ficaram tiveram que enfrentar muitas dificuldades, como fome e miséria, tendo como sua principal fonte de alimento o xique-xique (espécie de cactos). Mas a região tem uma riqueza indescritível, e existe uma energia maravilhosa, principalmente com as paisagens de tirar o fôlego. Grutas, grutas arqueológicas, muitas e muitas cachoeiras e a nossa amada rocha...
No dia do turismo fomos conhecer a Gruta Azul, e não nos arrependemos. O lugar era paradisíaco, apesar de não estarmos na época do famoso feixe de luz que reflete o fundo da gruta, tivemos a oportunidade de fazer flutuação na gruta da Pratinha, que fica no mesmo parque.
Após isso, optamos por ficar três dias em Lençóis-BA e o restante em Igatu-BA. Amamos ficar em Lençóis, para começar, o povo da região é extremamente hospedeiro. Chegamos lá desconfiados, haviam muitas pessoas se oferecendo para ajudar, querendo indicar pousadas e hostels, e nós estávamos decididos a encontrar um lugar bom e barato, não havíamos feito reservas pois queríamos conhecer o local primeiro, pois se não gostássemos da cidade nós seguiríamos. As cidades da Chapada são bem próximas e pequenas, dessa forma, não demorou muito e rodamos a cidade toda, nos surpreendemos com as ruas estreitíssimas. Houve um momento em que não conseguimos continuar o trajeto com o carro, tivemos que retornar pois o carro não passava naquela arruela. Mas, com a sorte ao nosso lado, encontramos a pousada da Lurdinha! Melhor impossível, chegamos lá, não vimos ninguém, então batemos na porta e a porta com o toque se abriu, rimos daquela situação, quase sem entender, pois não havia ninguém naquela casa, e tudo estava aberto. Muita tranquilidade, muita paz, que lugar é esse? É tão seguro e tranquilo assim? E realmente era, graças a Deus. Tão tranquilo, que à noite saímos para conhecer o lugar, fomos caminhando, queríamos degustar a culinária típica local, e fomos pegos pelo estômago com certeza! Como tudo as vezes pode ser perfeito, naquela primeira noite encontramos uma moça com uma sapatilha nas mãos, o Bruno olhou para mim e apontou com o olhar, então entendi tudo, e fomos com a maior cara de pau até ela e puxamos assunto, logo chegou o dono da sapata, e nos convidou pra conhecer um setor de escalada, o Barro Branco, seu nome era Henrique, mais conhecido por Gironha. Ele trabalha como guia em Lençóis e aluga equipamentos de escalada. Para nós foi sensacional, o único problema é que o Gironha nos aplicou uma, como era um setor em que ele havia aberto as vias, tudo era muito fácil para ele e nós humildemente pedimos uma via de 5º grau para aquecer e sentir a pedra, e acreditem ganhamos um gato por lebre, hehe. Depois de muito sufoco num lance da suposta via de quinto grau, alguém gritou: _ ahhh! Esse é o lance de sétimo grau, é o crux, kkkkk!!! Agora já foi, Bruno Schmidt já havia guiado toda a via, eu que não sou corajosa fui em tope sem muita esperança de concluir, mas deu certo, e ao final fiquei muito satisfeita de ter conseguido, na verdade fiquei eufórica.
O Gironha ficou só meio turno, nos deu um novo caminho para voltarmos pois a terra era privada, ops, porque não nos avisou antes? Ok, beleza, vamos fazer o caminho correto no retorno, o setor do barro branco ainda não tem croqui, tivemos o grande privilégio de conhecer, valew Gironha! Seguimos a escalada, mas nos deparamos com um perigo real, a escalada parecia viável, era um quinto grau, mas não havia base, o que havia era uma ponta de pedra e uma queda fatal, dessa vez quem tomou a frente foi o Eliezer Maciel junto com sua esposa Angela Feistel, quando cheguei aonde eles estavam dei um grito, e não concordei com aquele risco, graças a Deus ele também aceitou que não valia arriscar, e desistimos daquela via. Ainda tínhamos tantos outros setores para conhecer. As vezes o desejo de escalar é tão grande que tentamos minimizar os riscos acreditando no nosso potencial, é tão difícil dizer não para uma via que segundo o croqui está dentro das nossas condições. Para mim esse momento foi muito importante, pois meses atrás eu presenciei um acidente muito grave na escalada, exatamente por causa do afobamento do momento, minha amiga Claudia Almeida que deveria estar conosco nessa viagem, infelizmente ainda estava se recuperando do acidente. Talvez presenciar o acidente dela, tenha me deixado mais atenta aos riscos, e de certa forma mais responsável por ter essa experiência.
No dia seguinte fomos a muitos setores, do outro lado da cidade, o setor primavera foi o nosso xodó, escalada com a tão esperada cachoeira. Mas nada pode ser tão perfeito e ao chegar no lugar mais ou menos sinalizado pelo Gironha, nós não tínhamos uma trilha marcada, estávamos perdidos, e agora? O local estava cheio de guias, se oferendo, e nós agradecia e não queríamos um guia, mas no final nos rendemos, quando um rapaz muito querido disse que nós estávamos indo pelo caminho errado e que levaria a gente aos setores de escalada. Deixou a nosso critério, valorar a sua guiada. Fizemos uma caminhada de aproximadamente mais de uma hora, sem o guia não encontraríamos todos os setores que vimos. Não conseguimos escalar todos os setores, mas aproveitamos muito. Encontramos até um pé de sapatilha 5.10, e trouxemos ela na intenção de devolver ao seu dono. No caminho de volta, viemos por uma trilha mais óbvia, a do turismo, mas que não tinha acesso aos setores, como já havíamos escalado, pretendíamos apenas voltar. No caminho encontramos outra escaladora, a Carol, com a qual fizemos contato e pegamos altas dicas para ir à Igatu.

Imaginem um portal, e entrem em Igatu! Igatu é um distrito do município de Andaraí. É outro mundo, uma cidade com 408 habitantes. Uma pequena cidade feita de pedras. E o principal é que os setores de escalada estavam a 5 minutos do Hostel Igatu, onde conhecemos o LP, figura incrível, escalador de boulders, no seu hostel conhecemos outros escaladores e estreitamos os laços. Nossa felicidade e admiração só aumentavam, a cultura local é escalada noturna! Tivemos o prazer de conhecer figuras icônicas, conhecemos escaladores com alto grau de disciplina na escalada, com escaladas de graus elevadíssimos em boulders. E também os locais. Caminhar na praça e ver que em poucos dias já conhecíamos quase todos que moravam lá, despertou uma sensação muito boa em todos nós.
O grande atrativo de Igatu é a quantidade de pedras para escalar boulders, mas nós nos divertimos com as vias curtas escalando com cordas, guiando e superando nossos medos de escalar em um lugar que não conhecemos, onde tudo é novo. A viagem foi maravilhosa, não só no sentido de conhecer novos pontos de escalada, mas também no aspecto cultural e social. Viagens assim abrem a nossa mente e já lincamos outras viagens que em um futuro próximo iremos fazer.
Vias que tivemos a oportunidade de escalar:
Lençóis-BA
Setor Barro Branco - Fendinha 7ª
Setor Cordilheira - Melhor ainda 6º Sup
Setor Primavera - Macanudo 5º Sup
Setor das Tocas - Cinquentona 5º
Dola de dez 5º Sup
Setor Corredor - Via das meninas 5º
Igatu-BA
Setor Labirinto:
Ozimbés 6º Sup
Rosinha 4º
Arestinha 4º sup (variante 6º sup)
Josefina 4º sup
Mamão com açúcar 5º
Bom Jesus 6º sup
Primavera 4º
Princesinha 3º
Zorilda 5º
Meu parceiro é crente 6º
Asteróide 7º b
Movimento desumano 7ºa
Comments